quinta-feira, maio 15, 2008

Tomo banho com a minha visão cega, tentando lavar-me de mais um dia. Lavo o cabelo, a espuma escorre-me para os olhos e sinto-os a arder, mas não os posso esfregar pois sinto as mãos também com espuma, por isso recuo dois passos para encontrar a água que cai forte.
Estou reduzida a isto, a sensações na minha já desconhecida pele, porque a visão me foi roubada. Apenas sinto quando alguém me tira algo da mão e deixa ficar a sua mão na minha por meros segundos, sem conseguir ver o que isso significa.
Estou às escuras, tudo o que eu vejo é preto, sombrio, sem sinal de um raio de luz iminente. Perdi o caminho que tinha desenhado para mim, perdi a beleza de um pôr-do-sol e dos relâmpagos a rasgarem o céu escuro, perdi o meu equilíbrio, perdi a capacidade de ver as pessoas que precisam de mim. Agora as pessoas precisam de falar comigo, explicar tudo o que está à minha volta para que eu consiga perceber onde estou. Precisamos realmente de usar as palavras, acabaram-se aqueles momentos profundos em que uma troca de olhares ou um gesto bastava.
Desejava que não tivessem levado a minha visão, pelo menos assim teria cores vivas e figuras bonitas e quando acordasse de um pesadelo e abrisse os olhos saberia que tinha acabado. Tudo o que tenho são as recordações, memórias do que eu em tempos vivi. E são elas que mais me magoam, que me prendem àquilo que eu um dia tive e que me dão esta ridícula esperança de um dia conseguir abrir os olhos e ser feliz.
Mas que outra coisa me podiam ter tirado sem que eu sentisse falta logo a seguir? O olfacto não, assim deixaria de poder ligar os cheiros às pessoas, sítios e memórias; nem a audição, pois não poderia ouvir risos ou músicas que tanto despertam em mim. Muito menos o tacto, mas de que me serve sentir uma carícia se não consigo ver o rosto de quem a faz para saber se é de troça, nojo, compaixão ou amor profundo? Podiam-me tirar o paladar, já que tudo me sabe igual. Melhor ainda, que me tirassem os sentimentos, pois esses eu poderia inventar de maneira bem mais fácil e promissora.
Estou perdida num mundo que agora desconheço e preciso da minha visão para me encontrar.

sábado, maio 10, 2008

Acordar

Aproveito uma noite de extremo cansaço para tentar voltar a dar vida a este meu pequeno refúgio.
Não consigo dizer o que me aconteceu nestes últimos meses, apenas que houve uma avalanche na minha vida que eu ainda não consegui travar por completo. Estou perdida, perdida num mundo que não é o meu.
As palavras tornaram-se difíceis, difíceis de dizer e de escrever. Li os meus antigos texto, da época em que eu conseguia transparecer tudo aquilo que sentia sem medo. É isso que eu quero neste momento: transparência e claridade, força e coragem para conseguir sair desta penumbra que insiste em esconder-me. Quero reencontrar aquela esperança, aquela felicidade.
Agora só preciso de ver o teu sorriso... Está na hora de acordar.